Não vou me ater aos aspectos educacionais e pedagógicos atinentes à este Movimento, pois já existem diversos artigos e reportagens a respeito (criticando e defendendo), mas algo nisso tudo também chama muito a atenção, e é aí que mora a ilegalidade: A ação para denunciar “professores doutrinadores”, que supostamente abusariam da liberdade de cátedra.
Isto porque cada pessoa possui o direito à imagem, voz e honra protegidos pelo nosso ordenamento jurídico, como um direito fundamental e inalienável. É necessária a autorização da pessoa filmada/fotografada, ainda mais se tratando de um ambiente fechado, restrito à quem lá está, diferente de uma pessoa manifestando-se numa passeata em via pública ou comemorando o gol de seu time num estádio lotado com transmissão televisiva.
“São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”;
E ainda, o Código Civil afirma, em seu art. 20:
“Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.”
Assim, a legislação brasileira quis proteger acima de tudo, a dignidade da pessoa humana e o modo como o restante da sociedade enxerga e percebe aquela pessoa em sua reputação, a chamada “Honra Objetiva”.
Tratando-se especificamente de aulas cotidianas ministradas em ambiente escolar, não há pertinência, tampouco conveniência ou relevante interesse público em divulgar a imagem com juízo de valor e teor denuncista/alarmista sobre o professor em redes sociais, aplicativos de conversa e websites, portanto tal prática é ilegal e sujeita a pessoa e/ou seus responsáveis às respectivas sanções legais, como indenização por danos morais e outros danos que por ventura ocorrerem. Caso haja excesso ou atos fora da curva, há canais específicos dentro da própria estrutura educacional para que se resolva a questão.
“aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar”;
O objeto da proteção conferida pelo Direito de Autor é a obra intelectual. A Lei 9.610/98, que regula o assunto no Brasil lista algumas obras, a título de exemplo, no art. 7º:
“São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: […]
I – os textos de obras literárias, artísticas ou científicas;
II – as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza;
Portanto, a aula é uma criação intelectual do professor, protegida pelo Direito de Autor, para ser usufruída em determinado ambiente e sob determinado contexto para os alunos, que, devidamente autorizados, podem tomar nota do conteúdo fornecido em seus cadernos (ou tablets/notebooks). Até mesmo a exceção à regra, calcada no art. 46, inciso IV, desta Lei proíbe a publicação das aulas sem a autorização do professor. Vejamos:
Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais:
[…]
IV – o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aqueles a quem elas se dirigem, vedada sua publicação, integral ou parcial, sem autorização prévia e expressa de quem as ministrou;
Importante lembrar que tal autorização deve ser prévia e expressa, conforme diz o art. 29 desta Lei:
Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:
I – a reprodução parcial ou integral;
Então já sabemos que se não há autorização tácita, é preciso que o professor diga com todas as letras que autoriza que se filme a imagem, fala e a fotografia da lousa escrita, caso contrário este ato certamente irá ferir seus direitos autorais. Entretanto, é preciso saber no que consiste a chamada “Reprodução”. A Lei define logo no início, senão vejamos:
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, considera-se:
[…]
VI – reprodução – a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica ou de um fonograma, de qualquer forma tangível, incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer outro meio de fixação que venha a ser desenvolvido;
VII – contrafação – a reprodução não autorizada;
A captação e armazenamento das aulas em dispositivo eletrônico e sua posterior disseminação sem a devida autorização do professor constituem uma Contrafação, prática absolutamente vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Ainda que se utilize o argumento de que as filmagens e fotografias são apenas para obter prova para instruir processo judicial ou administrativo, não se pode cometer um ato ilícito para basear eventual e incerto pedido de indenização.
Ademais, a Lei discorre sobre as sanções às quais estão sujeitos aqueles que violarem direitos autorais, a partir do art. 101, que afirma:
“As sanções civis de que trata este Capítulo aplicam-se sem prejuízo das penas cabíveis”.
As penas cabíveis que ela se refere está no art. 184 do Código Penal, vejamos:
Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
Ainda, o art. 102 da Lei de Direitos Autorais é categórico:
“O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada, poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível”.
Sendo menor de idade a pessoa que comete tais violações, quem responde por eventuais danos são os pais e/ou responsáveis, conforme os Arts. 932 e 933 do Código Civil. Vejamos:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
Por fim, vale colocar aqui a expressão máxima do Estado Democrático de Direito, calcada no Art. 5º, IX da Constituição Federal:
IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;